Anatel erra no cálculo, e daí?

maio 5, 2020 by

Um dos principais problemas da área de telecomunicações em nosso país se dá na universalização dos acessos aos cidadãos, com qualidade e modicidade tarifária. Especificamente no acesso à banda larga fixa estamos longe de atingir essa meta no serviço mais utilizado atualmente, e que o Marco Civil da Internet declara ser essencial para o exercício da cidadania. Segundo relatório TIC Domicílios 2018 do CGI/CETIC.br, 33% dos domicílios brasileiros não têm acesso à internet, majoritariamente nas classes C, D e E.

A controversa aprovação do PLC 79/2016, que trouxe a possibilidade da migração das concessões do STFC para autorizações, veio com uma duvidosa contrapartida de investimentos em localidades onde o atendimento em banda larga se apresentasse inadequada, seguindo indicações do Plano Estrutural de Redes de Telecomunicações – PERT. No sentido de recolher informações da sociedade, a Anatel instituiu a Consulta Pública (CP) nº 5 (Regulamento de Adaptação das Concessões do Serviço de Telefonia Fixa Comutado – STFC – para Autorização) que estabelece uma metodologia para valoração desses investimentos em banda larga.

Nas contribuições dessa consulta pública, o Instituto Telecom participou da elaboração e subscreveu os termos submetidos pelo Clube de Engenharia. Com subsídios de uma consultoria econômica, ficaram evidenciadas as inconsistências da metodologia adotada pela Anatel para o cálculo do saldo da adaptação, fato este que representa enorme prejuízo ao erário e à sociedade brasileira.

Dentre os pontos mencionados na contribuição, destacamos o não controle dos bens reversíveis do STFC pela Anatel, conforme já mencionamos em edições anteriores desse Nossa Opinião, que veio a propiciar a alienação de parte deles, e que não tem nenhuma compensação no cálculo do saldo da migração. Além disso, a Anatel adota uma postura equivocada sobre esses bens insistindo na visão funcionalista (são reversíveis à União apenas parte dos bens), enquanto o Tribunal de Contas da União estabelece, já há algum tempo, que o correto é a visão patrimonialista (todos os bens do STFC são reversíveis à União ao final da concessão).

Outro aspecto importante não considerado na metodologia se refere aos recursos do faturamento do STFC que foram utilizados para o desenvolvimento de serviços privados, configurando subsídio cruzado, não permitido pela Lei Geral de Telecomunicações – LGT. A fórmula para cálculo do saldo da migração não considera este fato, e representa uma falha da Anatel em seu controle durante anos, e uma inaceitável persistência dessa anomalia na CP nº5, que beneficiou as operadoras no desenvolvimento de outros serviços, que deveriam ter recursos próprios pelas empresas.

As parcelas referentes aos saldos dos Planos Gerais de Metas de Universalização III e IV, que entram no cálculo da migração, têm indefinições que vão desde a não aceitação de seus valores por parte das empresas, como também à sua questionável aplicação em telefonia móvel 4G, o que caracterizaria investimento público em serviço privado.

A metodologia proposta pela Anatel desconsidera diversos aspectos extremamente relevantes para a mensuração do saldo de investimentos e a destinação desses recursos na migração de regime do STFC de concessão para autorização. Logo, é imprescindível uma ampla e profunda revisão da metodologia proposta na CP nº 5/2020.Em todas as parcelas da fórmula proposta para o cálculo do saldo para a migração encontramos inadequações, e ainda a omissão de outros fatores que deveriam estar presentes e que não foram devidamente considerados.

A Anatel favorece claramente às concessionárias em detrimento da sociedade. Assim como o atual presidente da República tripudia e pergunta: e daí?

Instituto Telecom, Terça-feira, 05 de maio de 2020

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