Cloroquina das telecomunicações

maio 19, 2020 by

Sabe aquela pessoa ou grupo que defende uma ideia que ninguém mais defende? Quando todos os médicos, pesquisadores, especialistas falam contra e só uma pessoa ou grupo defende?

Lembrou-se do presidente do Brasil? Sim, é ele mesmo – não esquecemos o Trump, mas não são a mesma pessoa?

Algo similar ocorre no setor das telecomunicações.

A cloroquina do setor de telecomunicações se chama massificação, a panaceia das operadoras. Funciona assim: tire todas as obrigações regulatórias, deixe a mão invisível de o mercado atuar, doe os bens reversíveis para as atuais concessionárias, troque as obrigações de universalização das concessionárias por compromissos vagos. Alguém acredita que essa fórmula  beneficiará os que mais necessitam de acesso às telecomunicações? Lógico que não.

Todos especialistas sérios afirmam que é impossível haver a universalização da banda larga, ou mesmo massificação, apenas por decisão e desejo das forças do mercado.

Os números mundiais demonstram que, sem o poder público, milhões de pessoas nunca terão acesso à internet.

Segundo a União Internacional das Telecomunicações a situação de exclusão digital é gravíssima. No mundo há cerca de 1,5 bilhão de estudantes que tiveram as aulas suspensas devido à pandemia. Destes, 826 milhões não têm acesso a computador em casa e 706 milhões não têm acesso doméstico à internet.

Na  África Subsaariana, constituída por 48 dos 55 países africanos, 89% dos alunos não têm acesso a computadores em casa e 82% não têm acesso à internet. Em metade da região, cerca de 56 milhões de alunos vivem sem ligação a redes de telefonia móvel.

E no Brasil? A situação é dramática, tanto em relação à pandemia como da exclusão digital.

Segundo a Unesco (Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura), “o Brasil é um país que luta com desigualdades extremas, inclusive em termos de ligação de internet de banda larga, com 70% do acesso agrupado em cinco grandes áreas urbanas.”

Os dados da pesquisa TIC Domicílios do IBGE, 2018, nos auxilia para demonstrar o fosso digital que existe em nosso país.  Entre os indivíduos das classes A (92%) e B (91%), o uso de Internet era quase universal, ao passo que entre os indivíduos das classes D e E, a parcela de usuários de Internet ainda era inferior à metade (48%).

Nós temos apresentado propostas para reduzir a exclusão digital no Brasil. Entre elas estão:

1)Transformar os pontos wifi os locais onde ainda estão instalados os orelhões. Esse é um modelo que vem sendo implantado em Nova York com sucesso.

2) A Agência Nacional de Telecomunicações deve cobrar das concessionárias Oi, Vivo e Claro a disponibilização de internet banda larga gratuita até 2025 nas escolas públicas. Essa obrigação consta dos contratos de concessão.

3) Impedir que os bens reversíveis (prédios, cabos, estações, antenas) sejam doados às concessionárias como deseja a Anatel. Se isso ocorrer será inviável executar qualquer política pública de inclusão digital.

4) O governo federal deve negociar com as concessionárias para que as famílias de baixa renda tenham acesso à internet a custo zero durante a pandemia.

A cloroquina não é a solução para a pandemia assim como a mão invisível do mercado não resolve o fosso digital das telecomunicações.

A nossa esperança e nossa luta é de que saiamos dessa pandemia com uma nova concepção de mundo na qual a elite nacional não  olhe apenas para o lucro e a  exclusão, inclusive a digital, seja banida. A solidariedade, o combate às desigualdades, a fraternidade, a inclusão, o amor ao próximo têm que estar à frente de qualquer interesse do mercado. As telecomunicações podem ajudar, e muito, nesse caminho.

Instituto Telecom, Terça-feira, 19 de maio de 2020

 

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