Nossa Opinião: Brasil, não mostre a sua cara

A Coalizão Direitos na Rede (CDR) vem, há anos, desenvolvendo a campanha Tire Meu Rosto da Sua Mira, que tem como objetivo central o banimento total das tecnologias de reconhecimento facial no contexto da segurança pública.
Essas tecnologias, cada vez mais disseminadas, não possuem eficácia comprovada e, por se basearem em dados probabilísticos, frequentemente cometem erros, especialmente contra pessoas negras e mulheres. Reproduzem e ampliam, no ambiente digital, as discriminações estruturais do chamado “mundo real”.
A campanha alerta ainda que o aparente apoio popular a essas tecnologias se dá por uma promessa ilusória de segurança. No entanto, o que se entrega, na prática, é “uma vigilância seletiva, racializada, cara e falha”. Mais do que isso: “quando funcionam ‘bem’, promovem vigilância em massa e reforçam o seletivismo penal”, agravando desigualdades históricas e aprofundando a criminalização da pobreza e da dissidência.
Essa lógica de vigilância se insere no contexto mais amplo do que se chama capitalismo de vigilância, uma forma de exploração baseada na coleta e comercialização de dados pessoais.
Criminalização do direito de protesto
Imagine, por exemplo, que você participe de uma manifestação pacífica e tenha seu rosto captado por uma câmera de reconhecimento facial. Se essa informação for compartilhada, intencionalmente ou não, com sua empresa ou seu chefe, que possuam uma visão política contrária à sua, o que poderá acontecer com seu emprego? Com sua reputação?
Nesse cenário, direitos constitucionais básicos, como o de ir e vir, o direito à privacidade, à reunião e à livre expressão, passam a ser flexibilizados, ou até mesmo desrespeitados.
“A possibilidade de ser alvo de vigilância permanente pode levar as pessoas a mudarem seus comportamentos, assumindo uma postura de autocensura, assim, mobilizações legítimas podem ser inibidas. A autocensura pode atingir de maneira mais profunda grupos mais vulnerabilizados pela repressão e pela violência estatal. Em casos limites, o uso dessas tecnologias pode ensejar até mesmo a criminalização do direito de protesto,” afirma a Campanha da Coalizão Direitos na Rede.
A gravidade do tema é evidente. Não se trata apenas de tecnologia, mas de democracia, equidade e liberdade. Por tudo isso, essas ferramentas devem ser banidas do uso na segurança pública brasileira. O futuro não pode ser construído sobre a vigilância, o medo e a desigualdade.
Instituto Telecom, Terça-feira, 30 de setembro de 2025
Marcello Miranda, especialista em Telecom