Negligência da Anatel custa R$121,6 bilhões

set 24, 2019 by

Em um importante documento, o Acórdão nº 2142/2019, o Tribunal de Contas da União (TCU) marca a estranha negligência da Anatel no “cumprimento de suas obrigações legais, contratuais e regulamentares” em relação ao controle dos bens reversíveis.

Em 1998, a agência assinou com as concessionárias, Oi e Vivo, Claro, os contratos de concessão. Nestes, entre outros pontos, há os chamados bens reversíveis (prédios, antenas, redes de fibra ótica ou de cobre etc.), orçados hoje em R$ 121,6 bilhões.  A Anatel é a responsável pelo controle destes bens.

E quem nunca fez o controle? A Anatel. Pior. No afã de defender a aprovação do PLC 79/16 ainda fez uma cartilha afirmando que os bens não são da União. Assessorou o Congresso para a entrega destes bens às concessionárias.

E o que diz o Acórdão do TCU?

1) Prejuízo aos consumidores: “Segundo o representante do Parquet (Ministério Público), a Anatel tem atuado de forma negligente no trato desses bens. Entende que a regulação dos bens reversíveis tem impacto direto em outro direito essencial do consumidor: de modicidade tarifária, previsto no art. 6º, § 1º, da Lei das Concessões. Isso porque a própria LGT, na letra expressa do art. 108 §§ 2º e 3º, determina que as receitas alternativas (v.g., venda de bens reversíveis) e demais ganhos econômicos que não decorram diretamente da eficiência empresarial sejam compartilhados com os consumidores”.

2) Fugindo da responsabilidade: “O problema insuperável, ao qual parece não atinar a Anatel, é que seu entendimento contrasta com os dispositivos da própria LGT, que determinam controle exaustivo dos bens reversíveis”.

3) Favorecimento às concessionárias: “Ora, se não se sabe quais eram os bens reversíveis em 1998 – competência legal expressa da Anatel – não há como abater da indenização requerida pela concessionária o valor correspondente a alienações, desvinculações, onerações e substituições, muito menos exigir a reversão desses bens. E sem conhecer os pormenores das mutações desse patrimônio, não terá a agência reguladora condições de questionar a relação de bens reversíveis que vier a ser apresentada pelas concessionárias ao final da concessão, nem segurança para definir o percentual ainda não amortizado desses bens, o que favorece imensamente as empresas concessionárias”.

4) Ataque ao patrimônio público: “Estranho que os beneficiários da inação da agência reguladora sejam exclusivamente as empresas concessionárias que, pela ausência completa de informações, tornam-se proprietários de patrimônio que não era seu, consistentes em bens vinculados ao serviço público. A ausência de acompanhamento dos bens reversíveis surtiu esse deletério efeito para o patrimônio público”.

5) As concessionárias não são donas dos bens: “Os grupos empresariais que adquiriram o controle acionário das subsidiárias de telefonia fixa da Telebrás, por sua vez, participaram da licitação, com conhecimento dos termos dos contratos de concessão então em vigor, assinados pelas subsidiárias da Telebrás, todos devidamente considerados na elaboração de suas propostas, as quais, no que tange aos bens reversíveis então existentes, apenas aquilataram a capacidade de gerar fluxo de caixa nos 25 anos da concessão”.

6) Sem indenização: “De qualquer forma, a referência à possibilidade de indenização por bens reversíveis adquiridos antes da celebração do contrato de concessão foi excluída dos contratos firmados em 2006 e 2011, ao que se sabe sem oposição das atuais operadoras de telefonia fixa, o que implica conhecimento e anuência à impossibilidade de indenização por bens essenciais a prestação dos serviços que já existiam antes da celebração dos contratos de concessão em 1998”.

7) Possibilidade de indenização: “Ainda assim, a indenização somente será devida se, ao final do prazo da concessão, esse bem não estiver inteiramente exaurido e ainda se mostrar necessário à prestação do serviço público, bem assim o investimento não tiver sido realizado em contrapartida ou com recursos correspondentes à alienação, oneração e substituição de bens reversíveis. Nesse contexto, o conhecimento detalhado dos bens utilizados pelas operadoras para prestação do serviço de telefonia fixa, obtido a partir do controle exaustivo dos bens reversíveis e de suas mutações”.

Ao final o Acórdão destaca: “Caso venha a ser apurado dano que se possa associar à omissão continuada no cumprimento de obrigações legais, contratuais e regulamentarias, decerto estarão os agentes da Anatel sujeitos à responsabilização, os quais deveriam ser os primeiros interessados em evitar que esse dano se concretize”.

A questão é grave. Gravíssima.

Instituto Telecom, Terça-feira, 24 de setembro de 20193

Acompanhe o Canal do Instituto Telecom

Comente

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *